Tínhamos mudado para o Canela, apartamento novo e estávamos aos poucos a organizar e a estruturar a nossa vida em comum. Fui olhar alguns terrenos na estrada do côco, para possíveis negócios, analisei igualmente algumas casas (que um amigo me mostrou) na zona histórica de Salvador – Pelourinho, que estavam disponíveis para pousadas, fui para o interior recôncavo, verificar focos de negócios e conversei com algumas pessoas amigas e com a família de Beto, pessoas muito bem conceituadas e relacionadas. Diga-se de passagem, que os tios de Carla prontamente se puseram à minha disposição, para ajudarem naquilo que fosse necessário.
Ao longo de todo o processo estreitei laços familiares muito intensos e profícuos, com todos os membros da família. O que notei de muito positivo, foi à união existente entre todos os membros dessa tradicional família baiana descendente de Portugueses e Italianos.
O meu telefone de casa tocou deveria ser meio dia, acho eu; a secretária do lar atendeu, era o pai de Carla – Beto. Estávamos em Setembro de dois mil e três, solicitou-me que eu fosse á tarde com Carla ao Cabula, depois do almoço, queria falar conosco.
Almoçamos e dirigimo-nos ao Paraíso Tropical, estacionei o carro, como sempre fazia perto da entrada do restaurante. Entrei cumprimentei Beto e pedi um suco de Morango sentei-me com Carla, ao meu lado ficou Beto que prontamente chamou a sua companheira, para fazer parte da conversa.
O mestre estava com uma cara séria, mas ao mesmo tempo tranqüilo o que denota paz de espírito – Não era nada de grave, pensei eu, algum problema! Talvez... Curiosos estávamos os dois.
Tenho pensado muito, em vocês e de que forma poderão utilizar o dinheiro que trouxeste – refletiu Beto – bem vos aviso que o dinheiro acaba e rápido, Ricardo és o marido da minha filha, deixaste a tua vida para vires para Salvador viver com Carla, isto que tenho é dos meus filhos, comecei do nada, como tu bem sabes, com muito trabalho cheguei até aqui – continuava Beto – gostava que Carla e Betinho (irmão de pai e mãe de Carla) tomassem conta de tudo, quando eu já não puder mais, gostaria de ter alguém que ficasse com isto, calmamente eu olhava para aquele homem e pensava, onde é que ele queria chegar, eu precisava reformar isto tudo, de comprar mesas, cadeiras, fazer obras, informatizar todo o restaurante, precisava investir aqui, como vês o terreno é grande, só precisa de uns ajustes – dizia – eu continuava calado escutando, bem como Carla – porque em vez de comprares a tal pousada que tanto queres, não fazemos uma sociedade!
Olhei para Carla, o semblante de Beto tinha alterado estava mais sério e continuava, fazemos uma sociedade nova, com outra razão social, ou então alteramos a atual, que está com o nome de Carla e Betinho. Sinceramente não esperava que Beto fizesse tamanha proposta, até pelo simples fato de ele ser o capitão de todo o processo criativo e o seu temperamento especial em relação ao que era seu.
Raramente admitia intromissões ou alterações ás suas decisões.
Beto antes de mais obrigado pelo convite, mas preciso pensar sobre tudo isto, como deve calcular, tenho alguma verba, mas o investimento deve ser bem calculado, até porque o negócio já existe e é de família, o meu desejo é começar algo de novo, noutro local.
Fui para casa refletir sobre o assunto.
A opinião de Carla era que eu consultasse primeiro os tios, irmãos de Beto que o conheciam extremamente bem e sabiam talvez aconselhar-me.
A opinião dela era que eu abrisse outro restaurante, noutro local da cidade, aproveitando todo o conhecimento e saber do pai e fizesse uma sociedade, com um contrato escrito e devidamente reconhecido pelo cartório, onde pagaria mensalmente, a estipular uma quantia, pela utilização do nome e de todo o conhecimento, mas a razão social seria diferente.
Como ela era sócia do Paraíso Tropical do Cabula, ela se desvincularia do mesmo e em nome dela abrir-se-ia uma nova razão social - uma nova empresa e assim ajudávamos o pai e o irmão, trabalhando em sociedade e dividindo todos os lucros, dando Beto uma assessoria constante, tanto na formação do cardápio, bem como no contínuo acompanhamento da nova fase do projeto a ser criado.
Achei a idéia interessante, mas ainda não tinha tomado nenhuma decisão.
Não tinha qualquer idéia de como funcionava um restaurante, ainda mais de comida Baiana, nem como poderia geri-lo, estava seriamente preocupado com toda aquela movimentação repentina e súbita.
Não tinha qualquer experiência na área em questão, sempre trabalhei na área financeira ligado a reestruturações de crédito financeiro, por outro lado, sempre fui um homem de desafios e a idéia de ajudar Beto, a catapultar o seu nome e a sua culinária para outras galáxias me entusiasmava muito e deixava-me intrigado. Eu só sabia o que era boa comida e bom vinho,quando me sentava á mesa de um restaurante, para comer e beber, disso percebia eu... Agora comprar e fazer para os outros, era algo desconhecido.
O espaço que o mestre possuía no Cabula, que com tanto amor criou e recriou ao longo dos anos, tinha uma clientela muito especial, apesar de ser um local simples.
Eu sabia disso e ás vezes pensava, durante este período de indecisão, que se juntássemos a maravilhosa culinária já existente, a um novo espaço, mais requintado, com um bom serviço de cozinha de garçons, uma boa carta de vinhos, manobrista, enfim um serviço de extrema qualidade, o sucesso estaria perfeitamente garantido.
Falei com algumas pessoas, a maioria aconselhava-me favoravelmente, com algumas ressalvas jurídicas, já que todo o capital a ser investido no possível negócio era todo da minha parte.
Beto não possuía situação financeira, para investir qualquer quantia no novo negócio.
Entraria com o nome e conhecimento e eu com o investimento financeiro.
Carla e Betinho, como tinham trabalhado com o pai, possuíam igualmente algum conhecimento, tanto na área de compras e aquisição de produtos, como na área de relações públicas e marketing e divulgação do negócio... Culinária só o mestre ou então a sua companheira.
O Paraíso Tropical no Cabula, tinha uma freqüência bastante especial.
Beto tinha um álbum de fotos, onde com muito orgulho exibia os seus clientes globais e não só.
Formadores de opinião: (a exp.: Arnaldo Jabor, Licía Fábio, Duda Mendonça) Atores: (a exp.: Luana Piovani, e tantos outros) Músicos: (a exp.: Ed Motta, Paralamas do Sucesso, Daniela Mercury) e muitos mais. Beto constantemente dava entrevistas aos órgãos de comunicação social, sobre a sua culinária inovadora e natural ou então apareciam artigos sobre si em revistas nacionais sobre a sua gastronomia.
Tinha sido escolhido, para representar o Brasil em Porto Seguro – nos Quinhentos anos dos Descobrimentos Portugueses em mil novecentos e noventa e oito.
Tudo isto acontecia com a maior naturalidade, sem o mínimo de snobismo ou presunção.
Conversei longamente, com os irmãos (as) de Beto que o conheciam extremamente bem...
A opinião era generalizada. Devia fazer o negócio, mas com os devidos cuidados de salvaguarda de contrato, evitando no futuro situações que pudessem vir a acontecer.
Apesar de tudo, aceitei. Era um desafio e que desafio. Começamos a planificar toda a estrutura do novo restaurante. Havia muito trabalho a desenvolver e o capitão de todo o projeto estava bem ciente das dificuldades que esperavam por nós.
Tivemos algumas reuniões preparatórias sobre como criar novos pratos ou alterar a culinária tornando-a mais célere.
Decidimos manter tudo como estava com algumas alterações que seriam implementadas ao longo do processo de criação.
A primeira questão a ser resolvida era arranjar um espaço suficientemente grande e confortável, onde pudéssemos adequar às características estruturais do projeto já existente no Cabula, ao novo restaurante. Começamos a indagar com alguns indivíduos ligados a imóveis se havia alguma casa, residência que estivesse á venda ou para alugar dentro da cidade de Salvador.
Não encontramos nada que nos servisse e que fosse ao encontro das nossas idéias.
Até que soubemos que Klaus Peter, que desenvolveu a atual Praia do Forte e que era o dono do Resort estava interessado em movimentar e revitalizar o espaço subjacente ao “Castelo Garcia de Ávila”.
(No ano de mil quinhentos e quarenta e nove, Tomé de Souza foi nomeado o primeiro Governador Geral do Brasil. Anos mais tarde, o seu filho, Garcia D’Ávila recebeu de seu pai quatorze léguas de terras de sesmarias, que iam desde Itapoá até Tatuapara (Praia do Forte). Nesse local Garcia D’Ávila construiu em mil quinhentos e cinqüenta e um, o Castelo da Torre de Garcia D’Ávila. Em poucos anos, tornou-se o maior latifundiário do mundo, administrando as suas terras da Casa da Torre que foi a primeira construção de grande porte do Brasil e o único castelo medieval das Américas).
O projeto era criar um restaurante perto do Castelo que tivesse uma boa culinária e que levasse os turistas que estavam hospedados na Praia do Forte e não só.
Tivemos algumas reuniões com os responsáveis, do Castelo – fomos várias vezes ao local – o espaço era bem localizado com uma vista deslumbrante, talvez um pouco pequeno para as nossas intenções, mas o que originou a nossa desistência foi à distância de Salvador e os problemas de logística que teríamos, tanto de funcionários como de materiais.